​O LUTO DA TRAIÇÃO

23 de Novembro, 2018

O LUTO DA TRAIÇÃO

Amor. Um suspiro na boca, o coração bate forte e a vida, de repente, desacelera. O amor surge como uma promessa: de felicidade, de unidade ou daquilo que está por vir. O amor é uma promessa de proteção; é embalado pela fantasia do ‘para sempre’. Nesse sentido, cria uma espécie de lapso no tempo: um espaço onde estamos guardados; um porto seguro.

A fidelidade, discorre Christian Dunker em seu livro Reinvenção da Intimidade, opera uma espécie de promessa que anda nesse sentido: promete suspender a morte ao enunciar que, de modo sempre idêntico, o amor será para sempre. Ora, esta é uma ficção. Necessária, porém, ainda uma ficção.

A traição envolve a violação deste contrato. Implica a quebra dessa promessa. Algo morre dentro do traído – mesmo que nunca tenha vindo a existir senão no campo da idealização e do sonho. O ‘para sempre’ encontra seu fim.

Como toda morte, a traição implica trilhar o caminho do luto. Luto pela relação. Luto pela confiança. Luto pelos sonhos. Como tal, percorrerá o caminho das cinco fases, conforme propostas por Kübler-Ross.

Primeiro a negação. Não é fácil descobrir que se foi traído. A dor que emerge deste golpe psíquico – lembremos, algo corre o risco de morrer dentro da gente – faz com que seja preciso se defender dela. Para algumas pessoas, ela se torna patológica. Quem nunca encontrou o traído ou traída que não acredita mais nem nos próprios olhos?

Depois vem a raiva. Raiva de quem traiu. Raiva de si por ter sido cego(a). Raiva do outro, o rival. Algo que, no calor do momento, pode se transformar em agressão.

A terceira fase é da barganha. É ora do “e se...”. E se tivesse feito diferente... E se tivesse feito mais (ou menos) ... E se... É uma forma de tentar, ainda que minimamente, obter algum controle da situação.

Em seguida, a depressão. Não tem jeito. Aconteceu mesmo e a traição cobra um preço. Não dá mais para fingir que não aconteceu nada e nem tapar o sol com a peneira. E isso dói.

Por fim, a aceitação. Aceitar não significa apagar o que aconteceu, mas integrar o acontecimento ao Eu e descobrir quem se é a partir disso. Significa mais aceitar que está modificado.

A traição, como processo de luto, pode ser uma jornada árdua. Isso porque ela envolve emoções completamente antagônicas: amor e ódio. Envolve também frustração e dano narcísico. Seja qual for o caminho, continuar junto ou se separar, será sempre importante olhar para isso. De outra forma, a ferida pode continuar a machucar. Ah, e tudo isso também é válido para quem foi o agente da traição! Ambos os lados precisam de cuidado psíquico.


Luiz Mateus Pacheco Psicólogo do NAP